Por que eu 'posso com todos esses sentimentos ao mesmo tempo - posso estar completamente triste e eufórico ao mesmo tempo' tanto quanto 'vivo nessa certeza de que o tempo destruirá todas as coisas indiscriminadamente'. Há momentos em que até ensaio algumas linhas com um certo sucesso [que vem do aplauso que o medíocre recebe do estúpido] e penso em uma ou outra história convincente. Sempre transito, com uma maestria que não é capaz de ser copiada, pelo amor e desprezo à vida - fazendo pausa no constante tédio que o convívio social me deu de presente. Uma forma de vida fotosintética que caminha com a graça de um rinoceronte em meio ao Caos. Sou um crente muito cético. Sou um amante da música que tem pavor pelo novo. Não entendo a arte conceitual, mas faço comentários que parecem inteligentes. Abandonei a idéia do vegetarianismo por que a gula é um pecado válido, e é o único que dá porta pra bulimia. Já fui de Junkie à Cristão, voltei ao Junkie e hoje me chamam de niilista, mesmo que eu não saiba [e acredite que ninguém de fato entende o niilismo] o que isso significa. Tem hora que me acho parecido com o personagem daquele filme, tem hora que sou a letra daquela música.
Mas no fundo eu sou essa histeria coletiva, sou essa inconstância 'raul seixiânica' e esse medo constante transando loucamente com a auto afirmação.
Sou um ponto de vista contrário à crença que carrego, por que me traio tantas vezes antes do café da manhã que lá pelo almoço eu pareço o resto de um estupro. Sou também a inconstância do ser, essa imutável leveza. Penso 'O que define uma cadeira? O que a torna uma cadeira? Se você a quebra ou ateia fogo nela, ela, por sua vez, continua sendo uma cadeira? O que é ela, então? E, de fato, o que sou eu? O que serei quando meu corpo for quebrado e queimado?'
Logo, meu caro, não posso dizer o que sou, se não o que sou agora. Não posso dizer à que grupo pertenço, se não ao que pertenço agora. Não posso dizer dos meus sonhos e anseios, do que me excita e do que me retrai, da vida que experimentei ali ou aqui. Não posso por que passo por essa constante mudança, por necessidade de sentir-me confortável sempre, sabendo que a comodidade é, de fato, mais viciante que a própria cocaína.
Consigo descrever a vida em mil sicronias - posso tanto adequar a vida a um pôr do sol quanto comparar a consciência ao ato de ir dormir. Mas, hoje em dia, me parece algo tão mecânico que não ouso sair de minha veia auto irônica e 'tragédia grega neo-cristã' para criar uma linda história que de fictícia teria somente os nomes porcamente trocados e palavras corajosas adicionadas meio que para encobrir o que eu realmente queria ter dito. Engraçado, meu bom José, mas agora que você falou eu notei que nem mesmo esse texto me descreve com a sinceridade que uma auto-biografia exige. Quando Nietzsche chorou só é belo por que não foi escrito pelo bigodudo niilista e o livro do Clapton passou por correção e edição. Logo, presumo, que é mais fácil falar de nós mesmos quando há alguém para confirmar ou corrigir o que dizemos. E, também, não faço um bom papel como juiz de paz de minha consciência.
E isso, meu caro amigo, não quer dizer nada. Só que eu posso ser tanto a cadeira intacta quanto a cinza da mesma.
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